13.6.10

TRÊS

Sentia uma certa dormência , uma sensação estranha que não me era familiar.
Deixei-me ficar ali sem me movimentar, não habvia razões para haver movimento.
Senti raiva de mim , do meu cérebro não se ter "lembrado" dele naquela noite.
Os meus pais tinham saído mais cedo , hoje , pelo que não saberiam que eu estava em casa e não saíria do quarto o dia inteiro . Que iria faltar às aulas .
Mas eles iriam chegar por volta das 19h e aí teria de destrancar a porta e sair do quarto , antes que um deles ao ver que eu nao reagia arrombasse a porta . Isso seria desnecessário , só causaria prejuízos.
Por agora , não me iria preocupar com isso . Desliguei o meu cérebro e não pensei em absolutamente nada . Deixei-me ficar ali .
O tempo passou muito lentamente , como sempre , mas os meus pais acabaram por chegar.
Ouvi a porta a abrir e depois a fechar . Ouvi passos , do meu pai , a dirigir-se , provavelmente , até à sala . Deixei de ouvir os tacões da minha mãe , o que foi estranho , por norma ela seguia o meu pai até à sala para conversarem sobre o seu dia . Enfim , não interessava , iria esperar que um deles subisse as escadas para destrancar a porta e sair do quarto .
- Inês ? Chegou uma carta para ti. - Gritou , com a voz um pouco rouca e num tom de voz um pouco agudo , comparado com o seu tom de voz habitual .
Era estranha aquela voz , parecia quase assustada , chocada , com medo de algo . Não percebi aquela reacção , mas provavelmente nao teria nada a ver comigo nem com aquela carta.
A minha mãe sabia que eu não ligava minimamente ao correio , pelo menos desde aquele dia . Aliás , ela sabia que eu agora não ligava a nada . Mas parecia querer ignorar esse facto e viver numa bolha onde só vê o que quer , tal como o meu pai .
Eles pareciam não querer abrir os olhos e ver o que se estava a passar à sua frente , fingiam que eu não me arrastava pela casa e pelas ruas como um zombie , fingiam que eu nao vivia sem convicção nem emoções , fingiam que eu estava bem . Talvez não bem , mas normal . E eu nao estava normal , eles apenas não queriam aceitar isso . Talvez fosse bom , assim não lhes causaria problema , nem procupações .
Pensei que como eu nao respondera , a minha mãe acabaria por desistir , como acontecia nas outras vezes .
- Inês , ... é do Diego. - gritou novamente , desta vez com uma voz realmente assustada.
Aí percebi o que ela temia . A minha reacção . Era isso que ela temia .
O meu coração falhou um batimento , senti isso . Depois começou a bater descompassado .
Levantei-me rapidamente (demais) , o que me fez desiquilibrar e voltar chão .
Não liguei , tornei-me a levantar ainda rapidamente , destranquei a porta com a mesma velocidade e quase voei escadas abaixo . Olhei para os olhos da minha mãe , que me olhavam e analisavam o meu aspecto depois de ter passado um dia inteiro deitada no chão e sem comer. Aí , a sua expressão mudou para algo que beirava o pânico .
Não tive tempo de reagir , tirei-lhe a carta das mãos e subi as escadas a correr .
Tranquei a porta e sentei-me na cama , de pernas cruzadas . Pousei a carta à minha frente e tentei acalmar o meu coração que parecia que me ia sair do peito a qualquer momento .
Devia estar a ter uma arritmia .
Respirei fundo várias vezes , tentando acalmar-me . Ao fim de algum tempo , estava melhor .
Peguei no envelope e olhei para ele .
Olhei para o meu nome , para a minha morada , para o nome dele , para a sua morada , para aquele envelope branco onde ele já tinha tocado e que agora estava nas minhas mãos.
O tremor das minhas mãos diminuira um pouco , pelo que me achei capaz de conseguir ler o que lá estaria escrito . Sentia um certo medo de ler o que dizia , mas acima de tudo desejava ler o que dizia apenas por ter sido ele a escrever . Ele .
Respirei fundo mais uma vez , preparando-me .
Com uma coragem que achava ter perdido, abri o envelope e retirei a carta .

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